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Mercado de carbono: oportunidades e desafios

Reportagem Especial | Reportagem de Capa | 01.09.2009




“A mudança climática é o principal problema ambiental de nosso tempo, o maior desafio para os reguladores do meio ambiente. É uma crise crescente com dimensões econômicas que envolve saúde, segurança e produção de comida, entre outros fatores.” Assim o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-Moon, define o desafio de governos e empresas empenhados em mudar esse quadro.
A missão não é nada simples, mas diversas medidas foram tomadas no passado e estão sendo discutidas hoje em busca de uma solução para o aquecimento global. Os principais vilões desta história são os chamados gases causadores do efeito estufa: dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e CFCs (CFxClx). Para diminuir as emissões, o maior acordo mundial sobre tema é o Protocolo de Kyoto (ver detalhes no quadro), que estimula a criação de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL) e a venda de créditos de carbono. O Brasil conta hoje com 405 projetos registrados, mas apenas um no setor de papel e celulose.

“O problema é que a área de florestas, uma atividade inerente ao setor, não é elegível para o Protocolo de Kyoto, pois sua regulamentação é muito mais complexa e não está na prioridade dos membros participantes”, avalia Eduardo Cabral Barrionuevo, diretor da consultoria JMalucelli & CMC Ambiental.
Luiz Cornacchioni, diretor de Relações Institucionais da Suzano, conta que a empresa tem acompanhado o mercado de carbono e todas as suas transformações. “Há alguns anos era um negócio que parecia que nunca iria acontecer e sair do meio acadêmico, mas este mercado veio para a vida real mais rápido do que muitos previam”, analisa.

Marcos Teixeira, assessor técnico da Cooperação Técnica Alemã no Brasil, organização que atua no desenvolvimento sustentável, ressalta que muitas iniciativas baseadas nas emissões evitadas no setor de celulose e papel ainda estão restritas ao mercado voluntário, como o Chicago Climate Exchange (CCX), da Bolsa de Chicago. “A maior dificuldade é a questão de escala. Os custos são altos para a alteração de processos e o rigor do mercado de Kyoto é muito maior do que o voluntário. Além disso, inscrever um projeto em Kyoto pode ser até dez vezes mais caro do que no mercado voluntário”, aponta.

Teixeira explica que hoje é muito mais viável ter projetos industriais que gerem créditos de carbono dentro do Protocolo de Kyoto do que na área florestal, segmento que somente agora está nas discussões do mercado, com a chegada do Fórum Mundial de Mudanças Climáticas, a ser realizado em dezembro em Copenhague (Dinamaarca). Apesar de a indústria de celulose brasileira alegar que, para cada tonelada de CO2 emitida sequestra outras duas por meio de suas florestas, não é dessa forma que os créditos são calculados. “Aí temos um problema do mercado de carbono, pois não basta ser bom para o meio ambiente, mas tem de ser bom dentro das regras e seguir seus requisitos”, explica Teixeira. Ele afirma que é difícil provar, no caso das florestas, quanto carbono está realmente retido em um produto. “O mercado de Kyoto gosta de garantias e se cerca delas.”

Barrionuevo acredita, no entanto, que existem muitos outros projetos de MDL nos quais o setor pode investir, como troca de combustível (com a mudança de uma caldeira a óleo para outra a gás ou biomassa) e reaproveitamento de calor das caldeiras, que resultam em economia de energia. “Na parte de efluentes, também é possível registrar MDL, mudando o tratamento anaeróbico com lagoas de decomposição para outro sistema.”

Foi justamente isso o que a Celulose Irani fez. Antes, a fábrica da empresa tratava seus efluentes com degradação anaeróbica, que emitia metano. Agora, o mecanismo é aeróbico, evitando, assim, emissões. O projeto da Irani, o primeiro MDL de efluentes registrado na ONU em toda a América Latina, tem capacidade para redução de CO2 certificada de aproximadamente 55.553 toneladas por ano entre 2008 e 2029. A Irani também ganhou créditos com sua usina de cogeração, utilizando biomassa na obtenção de energia para uso da fábrica de papel, localizada em Vargem Bonita (SC).

A Suzano optou primeiro pelo mercado voluntário do CCX, do qual faz parte desde 2005, e vende créditos de suas florestas plantadas no sul da Bahia, em Mucuri. “É um negócio muito complexo; precisamos primeiro realizar todo um levantamento do potencial de carbono das florestas plantadas e fizemos um inventário de absorção e emissões”, diz.

Agora, o próximo passo seria estudar, dentro da fábrica, possíveis projetos MDL, pois, apesar de as unidades do grupo serem modernas, Cornacchioni acredita que sempre é possível encontrar melhorias. “Estamos mapeando possibilidades e temos oito projetos em potencial, sendo que alguns deles deverão ser depois registrados como MDL e negociados também em Kyoto, que é muito mais rentável.”

Ele explica que o processo não é simples, pois com fábricas novas o espaço de manobra é bem pequeno. Outra forma de buscar sinergia em um mercado atento às mudanças climáticas é realizar inventário de carbono, o Carbon Footprint (Pegada de Carbono), que já é um diferencial. “Alguns clientes começam a nos pedir isso, pensando na neutralização do carbono, e acreditamos que será uma exigência de todos daqui a alguns anos”, aponta.

Para o executivo da Suzano, a venda de créditos de carbono é como um “chantilly sobre o morango”. A base mais importante, segundo ele, consiste em conhecer profundamente seu processo de produção (o quanto emite e absorve) e, depois, ver as oportunidades de MDL. “Quando existe a possibilidade de venda de créditos e de se fazer dinheiro com isso, fica ainda melhor, como com o chantilly”, compara.

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