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Livros impressos e digitais na disputa dos leitores

Reportagem Especial | Reportagem Especial | 20.01.2011




Se o silêncio tivesse o poder de parar a evolução dos acontecimentos mais temidos pelo setor, as mudanças do mercado seriam mais controladas pela vontade dos fabricantes de celulose e papel. O fato de não abordar o assunto, porém, nada muda o rumo que o desenvolvimento da tecnologia da informação vem tomando ultimamente. Quando se olha para o futuro da informação, não são mais os papyrus, e sim os e-papers que respondem pelo meio mais inovador de transmitir o conhecimento e a cultura de geração a geração.

Constituído por microcápsulas com partículas brancas dispostas em um líquido preto, o papel eletrônico reproduz o mesmo efeito da folha impressa. A evolução desta tecnologia – que inibe a interferência da luminosidade e, por isso, não cansa a vista – resultou nos equipamentos de leitura digital conhecidos como e-books.  Os aparelhos permitem que o consumidor monte sua própria biblioteca virtual, baixando os arquivos da internet.

Mas será que a interatividade e os efeitos especiais reproduzidos pelo e-paper já representam uma ameaça ao papel de imprimir e escrever? Para o gerente de Estratégia e Marketing da Unidade de Papel da Suzano, Adriano Canela, não há o que temer por enquanto. “O mercado de livros de papel ainda é muito promissor no Brasil.” Canela cita que o número de títulos editados em 2009 aumentou 2,7% sobre o do ano anterior, conforme uma pesquisa da Câmara Brasileira do Livro (CBL). “As vendas cresceram 8,11% em 2009 em comparação aos resultados de 2008”, completa. Os indicadores da Suzano confirmam os dados positivos apresentados pela pesquisa da CBL. O balanço do segundo trimestre deste ano mostra que as vendas de papel de imprimir e escrever representaram 77,6% do volume total de papel negociado pela empresa e aumentaram em 17,8% em relação ao mesmo período do ano passado.

“Com as estratégias corretas, a atuação conjunta de livros impressos e digitais deve perdurar por muito tempo”, avalia Vitor Tavares, presidente da Associação Nacional de Livrarias (ANL) e diretor das Livrarias Loyola, reforçando a tendência de crescimento do consumo de papel pelo mercado editorial nos próximos anos. Para o presidente da ANL, o livro digital como simples plataforma de leitura não oferece nenhum diferencial em relação ao livro impresso. “Pelo contrário, considerando somente esse quesito, os aparelhos eletrônicos perdem pontos, devido ao preço”, frisa Tavares. Mais uma questão levantada pelo presidente da ANL diz respeito à acessibilidade. Se por um lado o e-book apresenta o benefício de reunir inúmeras obras em um só aparelho, por outro é privativo. “Trocar livros é uma prática comum entre as pessoas. Quando você tem um aparelho eletrônico, o uso acaba sendo exclusivo”, observa.

De olho na tela ou no papel?
O gerente de Negócios de Imprimir e Escrever da MD Papéis ressalta que “a maioria das pessoas ainda desconhece ou não tem acesso aos livros digitais”. Essa realidade é confirmada por uma pesquisa realizada em maio último pela GfK, empresa de pesquisa de mercado.
Os resultados, com base na opinião de 1.000 pessoas com mais de 18 anos entrevistadas em 12 regiões metropolitanas, indicam que, do total de participantes, 67% não conhecem o livro digital. Entre os entrevistados que afirmaram conhecer os e-readers, 71% não acreditam que o meio eletrônico ameace o impresso. Por outro lado, a intenção de compra da plataforma de leitura eletrônica se mostrou significativa: mais da metade dos participantes que conhecem o e-book (56%) respondeu que adquiriria o equipamento se o preço fosse acessível. A inclinação para compra foi maior entre os entrevistados de 25 a 34 anos (67%). Este último dado revela um fato: a Geração Y está aí!

“A Geração Y, que já nasceu convivendo com a tecnologia, terá muito mais facilidade para se adaptar às novas plataformas de leitura”, reforça Tavares, presidente da ANL, ao se referir ao potencial do mercado dos e-readers. Para ele, embora o mercado editorial impresso ainda não tenha sido abalado pelos meios virtuais, é fundamental que toda a cadeia dos livros impressos atente às transformações e as acompanhe. “É difícil avistar onde os caminhos da tecnologia e inovação vão dar, mas já dá para notar claramente o início da trilha. Dentro de cinco a dez anos, pelo menos metade das vendas de livros no mercado brasileiro será de e-books”, estima Tavares.

O grande desafio do mercado editorial impresso é atrair a atenção e o gosto da nova geração pela leitura em papel. “O jovem é mais propenso a buscar informações jornalísticas nas plataformas digitais. Os veículos impressos precisam, cada vez mais, ter linguagens e abordagens que atraiam esse público”, sinaliza Ricardo Pedreira, diretor executivo da Associação Nacional de Jornais (ANJ).

O fim da circulação impressa do Jornal do Brasil (JB), um dos diários mais antigos do Brasil, fez a ameaça da mídia digital parecer bem próxima do papel imprensa. Em setembro último, o jornal informou aos leitores que seria o primeiro veículo 100% digital do País. “É claro que empresas jornalísticas terão presença cada vez maior nas mídias digitais, mas a mudança do JB trata-se de um caso isolado”, opina Pedreira. De acordo com ele, o jornal deixou de ser um veículo impresso por um insucesso empresarial e, a rigor, não reflete nenhuma consequência à mídia impressa brasileira. “O mercado de informação jornalística tenderá a ficar mais e mais fragmentado, porém a convivência das mídias impressa e digital será perfeitamente possível”, acredita.

Segundo Breno Machado, diretor do Comitê de Gestão da ANJ, os meios digitais trazem uma enorme gama de alternativas para estar em contato com os leitores, oferecendo novos serviços e criando novas receitas. “Os jornais online só representarão uma ameaça quando construírem uma marca com credibilidade competitiva à dos veículos impressos.” Os principais jornais do País já têm um planejamento próprio para serem competitivos tanto no meio impresso quanto no online. Em termos de edição, Machado explica que “alguns simplesmente reproduzem a versão impressa na internet; outros disponibilizam novas informações online; uns se limitam à edição do dia e ainda outros permitem o acesso a edições anteriores”. Quanto a cobrar ou não pelo acesso, depende da estratégia de cada veículo. “A maioria oferece um acesso limitado gratuito e um acesso pago, mais amplo e rico em serviços”, posiciona Machado.

O estudo Global Entertainment and Media Outlook 2009-2013, elaborado pela PricewaterhouseCoopers, mostrou que a proporção de publicidade nos meios digitais ocupou uma fatia de 5,4% em 2009 e deverá crescer anualmente à média de 7,7% até 2013. “A internet, portanto, passaria a representar aproximadamente 10% do bolo publicitário brasileiro”, comenta Machado, da ANJ. Para o executivo, a participação da internet na distribuição total da verba publicitária no País é significativa e demonstra uma tendência irreversível. Na prática, o investimento direcionado a TVs, jornais, rádios e outros meios será compartilhado pela internet. “Sem dúvida terá impacto sobre os jornais impressos. A grande questão é a velocidade com que isso acontecerá e o modelo com que os jornais desenvolverão sua presença online.”

A estratégia dos fabricantes de papel de imprimir e escrever tem sido fortalecer seus próprios atributos vantajosos como meio de leitura. “Não queremos nem devemos competir diretamente com os e-books, mas sim mostrar aos leitores as qualidades e os benefícios do livro impresso”, ressalva o gerente da MD Papéis, André Assis Pinto. “O livro tradicional é uma forma de guardar lembranças de experiências de vida, sem falar do toque no papel, que transmite muito mais emoção”, reforça. Compartilha dessa mesma opinião Ronald C. Dutton, diretor comercial e de Marketing de Papéis Finos da Arjowiggins Security. “O papel oferece sensações que a tela plana do leitor digital não consegue dar, como realces e texturas. São aspectos que, por si sós, já são um diferencial dos papéis finos.”

Para atrair os leitores com a característica lúdica do tato, a Arjowiggins investe no portfólio constantemente. No primeiro semestre deste ano, a empresa apresentou ao mercado editorial a linha Metal Color, de papéis com brilho metalizado nas duas faces que mudam de cor conforme a incidência da luz. “Nossa estratégia é manter essa posição de diferenciação”, revela Dutton. O diretor comercial acredita que os papéis finos tendem a conquistar uma fatia cada vez maior do mercado, devido à maior adesão do universo promocional.  “Os próprios fabricantes de e-readers buscam papéis finos para produzir seu material de divulgação. Produtos sofisticados precisam transmitir tal caráter, o que fortalece o segmento de papéis especiais.”

Indo além dos costumes dos leitores para fortalecer o segmento de papel, a estratégia da Suzano foi conversar diretamente com as principais editoras de livros do Brasil para fortalecer seu produto, a partir das necessidades desse público. Os resultados podem ser vistos na linha off-white Pólen, que apresenta tonalidade diferenciada e reflete menos luz, proporcionando uma leitura mais confortável. “Já atendemos bem ao mercado que busca superioridade em lisura e baixo corpo com o Pólen Soft®. Agora, trouxemos ao mercado o Novo Pólen Bold®, indicado para livros mais encorpados”, informa Canela sobre o lançamento do produto da Suzano, realizado em agosto último.


BOX – Leitores digitais se espalham nas vitrines
O aparelho Kindle, da marca norte-americana Amazon, foi o pioneiro da categoria e-books e já ganhou inúmeras versões atualizadas. Os modelos disponíveis na loja virtual Amazon.com, que trazem opcionais com internet sem fio e rede global de roaming 3G, atendem a mais de 100 países, incluindo o Brasil. Os interessados pagam taxa de importação, que faz o aparelho mais simples custar, em média, R$ 500.

No primeiro semestre deste ano, o Kindle ganhou um concorrente de peso: o iPad, da Apple. O termo tablet reflete bem a ideia do computador em formato de prancheta, que reúne, além do leitor de livro digital, computador, videogame e tocador de música. O produto ainda não está disponível no mercado brasileiro, mas a previsão é de que chegue às lojas ainda em 2010 (só não se sabe a que preço). Nos Estados Unidos, o tablet custa cerca de R$ 900, conforme o modelo escolhido.

Aqui, no Brasil, o consumidor já encontra representantes nacionais dos e-books. A Gato Sabido, primeira e-bookstore brasileira, fundada em dezembro passado, oferece títulos de editoras nacionais e internacionais. Além disso, conta com seu próprio leitor digital, o Cool-ER. Com tela de seis polegadas, o aparelho tem capacidade de armazenamento de 1 GB de memória e expansão de 4 GB. No segundo semestre deste ano, a Positivo Informática também lançou seu e-reader e, neste mês, já apresentou a nova versão do aparelho, com internet sem fio. À venda em livrarias e redes varejistas, o Positivo Alfa Wi-Fi se apresenta em uma tela de seis polegadas, tecnologia touchscreen e 2 GB de memória – capacidade suficiente para armazenar até 1.500 livros.

Outra opção recente do mercado nacional de e-readers é o ER-7001, da Elgin Info Products. Recém-apresentado aos consumidores, o aparelho traz diferenciais como tela de sete polegadas, LCD colorido e capacidade de armazenamento de até 2 mil livros, com memória interna de 2 GB e externa (não inclusa) de até 32 GB. O modelo ainda vem com alto-falantes embutidos. Os preços dos e-readers nacionais citados variam de R$ 600 a R$ 800.


 

Caroline Martin
Especial para Revista O Papel